O buraco em baixo do rodapé
Dois anos atrás, depois de uma separação, mudei de apartamento e resolvi morar num conjugado 5 vezes menor do apartamento que morava antes. Resolvi fazer uma obra para deixá-lo mais confortável e chamei um arquiteto amigo meu.
Foi uma obra radical, pois o arquiteto resolveu mudar a geografia do conjugado, criando um conceito baseado na única entrada de luz do imóvel, portanto tudo foi abaixo. Depois de seis meses dei a obra como concluída, pois segundo este mesmo arquiteto, obra não se termina, se abandona.
Fiquei muito feliz com o resultado, principalmente pelo conceito desenvolvido, estou contente de morar aqui e não tenho a menor vontade de mudar-me para um lugar maior. Bom, vamos a história do buraco do rodapé.
Uma amiga minha veio visitar o apartamento no término da obra. Ela entrou, olhou para um lado, olhou para o outro, para cima, para baixo e disse: "têm uns buracos entre o piso e o rodapé". ??? !!! Ela não é da área de construção civil nem decoradora, mas o comentário me chamou a atenção.
Eu esperava um elogio pela obra ou pelo conceito, mas ela simplesmente achou um defeito. Confesso que também tinha visto alguns buracos de 1 ou 2 milímetros, falta de acabamento do empreiteiro, mas não poderia ser o único comentário da obra. Bom, acho que essa amiga não estava em seus melhores dias e acabou fazendo esse comentário. Ela continua sendo minha amiga e agora gosta muito do apartamento. Ah, os buracos continuam aqui e não me causam nenhum trantorno.
Mas porque conto esta história, porque o comentário do buraco do rodapé, que é um fato, parece um pouco de como a nossa imprensa vem se portando. Ela encontra um pequeno detalhe, um fato, em alguma notícia e acaba destacando apenas esse detalhe e deixando a grande obra de lado, ou melhor, para o final do texto.
Resolvi contar esta história depois de ler a postagem: Choque de impressão, no blogue do Gadelha sobre a forma que a nossa imprensa tem descrito e escolhido os fatos. Também vale a leitura no blogue do Nassif da postagem: A mídia e os direitos fundamentais.
Para vender jornal, se a obra do meu apartamento fosse matéria, a manchete seria mais ou menos assim:
Depois de seis meses e gastos astronômicos, o que se vê são buracos no rodapé
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